quarta-feira, 18 de março de 2009

UMA GATA CHAMADA CHIQUINHA

O besouro amarelo é um dos meus brinquedos preferidos ...

Esta é uma fábula de final triste. Na cidade de São José do Rio Preto vivia uma família que tinha uma gata chamada Chiquinha. Um dia, a família precisou se mudar e, por algum motivo que ninguém conseguiu descobrir, decidiram não levar a gata junto. Um casal de vizinhos passou, então, a cuidar de Chiquinha. Mas, como todos sabem, os gatos são muito apegados à casa em que vivem - e aos donos também, embora insistam em pregar o contrário. Com Chiquinha não foi diferente: ela comia ao lado dos novos donos, mas passava o resto do tempo no portão da casa em que nasceu e viveu toda sua vida até ser deixada para trás.Um dia chegaram os novos moradores para ocupar a velha casa de Chiquinha, entre eles um estudante de direito de 26 anos, dono de dois cães pitbull. Com medo dos cães e talvez por desconfiar que aquela casa já não era mesmo sua, Chiquinha nunca cruzou o partão: ficava o tempo todo na calçada, provavelmente ainda tentando compreender o abandono, coisa que nós humanos também não conseguimos aceitar direito. Chiquinha não fazia nada além de olhar, mas apenas isso irritou o estudante de direito.Ao voltar da faculdade uma noite dessas e ver a gata novamente na calçada, o estudante não se conteve. Apanhou Chiquinha pelo rabo, a girou duas vezes em torno da cabeça e a arremessou contra um muro. Algumas pessoas que passavam pelo local interromperam a barbárie e denunciaram o estudante à polícia, no momento em que ele se preparava para pisotear a gata.Chiquinha quebrou as duas patinhas dianteiras e, apesar de uma cirurgia que tentou reconstituir seus ossos com pinos de metal, ela ficou praticamente aleijada - consegue se locomover, mas manca muito.A notícia só não dizia se Chiquinha ainda insiste em sentir saudades e a observar por longas horas a casa em que nasceu...Em pouco tempo aquele estudante estará formado, apto a entrar com celular nos presídios de segurança máxima ou a colaborar com traficantes e sequestradores. E nós, como Chiquinha, continuaremos nossa marcha em direção a algum futuro incerto. Mancando cada vez mais.

sábado, 10 de janeiro de 2009

SIMPLESMENTE GATOS...

PAZ E SOSSEGO-Quando quero paz e tranquilidade para as minhas sonecas procuro descobrir lugares diferentes, como o armário de sapatos do meu dono, e o armário de tapetes. Legal, não?
SIMPLESMENTE GATOS...
Bichos polêmicos sem o querer, porque sábios, mas inquietantes, talvez por isso...nada é mais incômodo que o silencioso bastar-se dos gatos. O só pedir a quem amam. O só amar a quem os merece.

O homem quer o bicho espojado, submisso, cheio de súplica, temor, reverência, obediência. O gato não satisfaz as necessidades doentias do amor. Só as saudáveis.

Lembrei, então, de dizer, dos gatos, o que a observação de alguns anos me deu. Quem sabe, talvez, ocorra o milagre de iluminar um coração a eles fechado?

Quem sabe, entendendo-os melhor, estabelece-se um grau de compreensão, uma possibilidade de luz e vida onde há ódio e temor? Quem sabe São Francisco de Assis não está por trás do Mago Merlin, soprando-me o artigo?

Já viu gato amestrado, de chapeuzinho ridículo, obedecendo às ordens de um pilantra que vive às custas dele? Não! Até o bondoso elefante veste saiote e dança a valsa no circo. O leal cachorro no fundo compreende as agruras do dono e faz a gentileza de ganhar a vida por ele. O leão e o tigre se amesquinham na jaula.

Gato não. Ele só aceita uma relação de independência e afeto. E como não cede ao homem, mesmo quando dele dependente, é chamado de arrogante, egoísta, safado, espertalhão ou falso.

"Falso", porque não aceita a nossa falsidade com ele e só admite afeto com troca e respeito pela individualidade. O gato não gosta de alguém porque precisa gostar para se sentir melhor. Ele gosta pelo amor que lhe é próprio, que é dele e ele o dá se quiser.

O gato devolve ao homem a exata medida da relação que dele parte. Sábio e espelho. O gato é zen. O gato é Tao. Ele conhece o segredo da não-ação que não é inação. Nada pede a quem não o quer.

Exigente com quem ama, mas só depois de muito certificar-se. Não pede amor, mas se lhe dá, então ele exige. Sim, o gato não pede amor. Nem depende dele. Mas, quando o sente é capaz de amar muito. Discretamente, porém sem derramar-se. O gato é um italiano educado na Inglaterra. Sente como um italiano mas se comporta como um lorde inglês.

Quem não se relaciona bem com o próprio inconsciente não transa o gato. Ele aparece, então, como ameaça, porque representa essa relação precária do homem com o (próprio) mistério. O gato não se relaciona com a aparência do homem. Ele vê além, por dentro e pelo avesso. Relaciona-se com a essência.

Se o gesto de carinho é medroso ou substitui inaceitáveis (mas existentes) impulsos secretos de agressão, o gato sabe. E se defende do afago. A relação dele é com o que está oculto, guardado e nem nós queremos, sabemos ou podemos ver. Por isso, quando surge nele um ato de entrega, de subida no colo ou manifestação de afeto, é algo muito verdadeiro, que não pode ser desdenhado. É um gesto de confiança que honra quem o recebe, pois significa um julgamento.

O homem não sabe ver o gato, mas o gato sabe ver o homem. Se há desarmonia real ou latente, o gato sente. Se há solidão, ele sabe e atenua como pode (ele que enfrenta a própria solidão de maneira muito mais valente que nós). Se há pessoas agressivas em torno ou carregadas de maus fluidos, ele se afasta. -Artur da Távola